PERDEMOS O FOCO
A grande maioria de nós não precisa mais lutar pela sobrevivência, lutamos, na verdade, pela satisfação de nossos desejos, sejam eles quais forem, mas que, na esmagadora maioria das vezes, é um desejo material, de posição social destacada ou de prestígio no campo profissional.
Nossa evolução como espécie, nos dá, a partir da inteligência e do raciocínio contínuo, a possibilidade de aperfeiçoar nossas reações instintivas, que poderíamos chamar de “inteligência automática”, desenvolvida pela natureza para nos manter vivos, entretanto, o que tenho visto, é que estamos regredindo, enquanto seres sociais, à nossa posição anterior, e temos colocado nossa inteligência a serviço do nosso instinto, invertendo, desgraçadamente, o processo.
Digo isso pois tenho percebido, cada vez mais, que cada um de nós passa a maior parte de seu tempo, tentando garantir a satisfação de seus próprios desejos sem pensar nas necessidades daquele que está ao seu lado, sendo que isso fica mais discrepante, diria até bizarro, quando vemos o caminho que temos tomado na área da saúde.
Hospitais desaparelhados, apresentando carências absurdas, lotando profissionais mal remunerados e, na maioria das vezes, esgotados pelas “outras atividades” que tem que desempenhar para manter seus “desejos” satisfeitos; pressionados por administradores preocupados com seu prestígio político e desconectados da realidade que enfrentam seus comandados; voltados para números e estatísticas cujos resultados levam a conclusões que só não são mais absurdas do que a precariedade da saúde pública do nosso país.
O argumento de que vivemos em um país pobre e que não temos recursos para reverter esta situação não me convencem mais, depois de ver tantos e tantos milhões de reais desviados pela corrupção ou mal utilizados pelo descaso e pela falta de compromisso das pessoas que o administram, a não ser, o compromisso de satisfazer os seus próprios desejos e os daqueles que os cercam e apóiam a fim de permanecerem em seus cargos.
Hoje já não sabemos mais porque estamos trabalhando, perdemos o foco, estamos perdidos, pois já não sabemos bem porque começamos, e muito menos onde vamos parar.
Porque estou dentro do hospital?
Porque existe o hospital?
Qual é o objetivo das pessoas que trabalham em um hospital?
Infelizmente, para todas essas perguntas, nenhuma das respostas é: Para cuidar das pessoas doentes; lamentavelmente, nenhuma destas perguntas, tão básicas, pode ser respondida com essa resposta que parece tão óbvia.
Cada um tenta não se prejudicar, cada um correndo atrás de seus desejos já não tem como foco principal cuidar do doente, mas cuidar de si mesmo, evitar problemas ou complicações.
Nessa hora me lembro do que um professor me dizia:
- Quando um doente entra num hospital temos três problemas: o do paciente; que gera um problema para o médico e, cuja resolução, gera um problema para o hospital, mas cuja hierarquia de resolução é exatamente inversa.
Estamos dentro dos hospitais públicos tentando resolver nossos problemas e os hospitais estão tentando resolver os seus enquanto os pacientes estão abandonados à sua própria sorte, culpados por estarem “causando problemas”. Esta é a lógica perversa com a qual convivemos hoje.
Não podemos encontrar paz, harmonia e felicidade em nossas vidas se não estivermos trabalhando em algo que nos faça bem, afinal de contas, passamos a maior parte do nosso tempo trabalhando, então, temos que escolher nossa profissão pela vocação, palavra que deriva da palavra “vontade”, ou seja, a vontade de fazer determinada tarefa.
Falta vontade do poder público, falta vontade dos profissionais da saúde e, por incrível que pareça, falta vontade dos pacientes já que percebemos que, mesmo eles, querem alguém para resolver seus problemas e não recursos para ajudá-los a resolvê-los. Nesse modelo instalado, estamos fadados ao insucesso.
Num mundo tão complexo, que nos apresenta tantas alternativas, não podemos nos perder no caminho, temos que manter nossas referências, sabendo sempre de onde viemos e para onde vamos, por isso, não posso aceitar o fato de que, infelizmente, a maioria dos profissionais procuram apenas “não ter problemas” evitando o problema do outro, esquecendo-se de que escolheu, como forma de vida, trabalhar justamente para resolver o problema do outro.
Prof. Dr. Décio Iandoli Jr. – Com doutorado em medicina pela UNIFESP-EPM, é professor titular da cadeira de Fisiologia nos cursos de Fisioterapia, Farmácia e Biologia da Universidade Santa Cecília (UNISANTA), responsável pela disciplina de Envelhecimento e Espiritualidade do curso de Gerontologia da UNISANTA, atual vice-presidente da Associação Médico-Espírita de Santos (AME-Santos), e autor dos livros “Fisiologia Transdimensional”, “Ser Médico e Ser Humano” e “A Reencarnação Como Lei Biológica” editados pela FE. Apresenta o programa “Ciência e Espiritualidade” pela TV Mundo Maior. E-mail: decio@movimentoespirita.org
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